Era uma vez um eu, que sonhava com um nós, porque só assim tudo fazia sentido!
Era um eu, com uma adolescência com pouca testagem e chegou a adulta sem frustrar quase nada!
Tudo o que queria tinha, mas o problema era que queria pouca diversidade!
Aprendeu que tinha de ser socialmente aceite e por isso passou a ser um eu com vergonhas e tabus!
Com pouca testagem, não aprendeu com os erros e apostou tudo na idealização!
E na idealização tudo é bonito, fácil e sem consequências!
Como experimentou pouco, os comparativos não a ajudam na avaliação dos outros!
Assim, quando aparece um tu, tenta encaixa-lo nas suas idealizações!
Ouvir coisas bonitas, fá-la sentir especial!
E como idealizou um amor para sempre, acredita que quem a elogia lhe quer bem!
Coisas bonitas destrancam o seu coração e tiram-lhe a roupa do corpo!
Um tu, com boas falas e que finja ser quem não é, parece-se muito com o que o eu, idealiza!
Depois, do eu entregar o corpo ao tu, nada a impede de amar eternamente!
Fazia sentido ao eu, juntar-se ao tu e serem um nós!
Deixar de ser só um eu, fazia-a feliz pois num nós estava mais protegida!
Num nós podia construir, partilhar e dividir tudo a dois!
O eu, sentia-se tão mas tão feliz com o tu, que aos poucos, foi-lhe dando tudo sem nada pedir em troca!
Amava, cuidava, orgasmicava, dedicava-se e vivia todos os dias a provar ao tu, que era o eu, certo para ele!
O eu, dizia para o tu que o tu era um amor para a vida!
Ser feliz para sempre era a idealização suprema!
Com o tempo, o tu aproveitava o amor do eu e fazia cada vez menos!
Não precisava de fazer nada, pois o eu vivia para lhe provar, que era merecedora de estar num nós com ele!
Nos amores para sempre, uma das partes pode ir à boleia!
Há sempre uma parte, que nos momentos difíceis, aceita tudo para não deixar de pertencer a um nós!
Nada é pior, para um eu que decidiu ser um nós, ter que voltar a ser um eu!
Depois de ser nós, um eu sente sempre que lhe falta algo!
O nós, cresceu e transformou-se pois, já não era a soma do eu e do tu, mas sim a diminuição de um dos eus!
O outro eu, passou a ser um eu do quero posso e mando!
E o eu, que foi diminuído pelo eu do posso quero e mando, obedece para não perder o amor da sua vida!
O eu, do quero posso e mando, tinha passado de idealização a realidade e agora a pesadelo!
O eu estava num nós, mas no dia a dia vivia como se fosse um eu!
O nós existia, só para os encontros de família, aniversários e funerais!
No dia a dia o eu, fingia que era feliz no nós!
Os dias, semanas, meses e anos passavam e com medo de deixar de ser um nós, o eu adaptava-se a viver o contrário do que tinha idealizado!
Não era daquelas histórias, com o final feliz!
Nos sonhos e às vezes entre lágrimas, ainda sonhava com golpes de magia e felicidade para sempre!
Mas o único para sempre que ia viver era as faltas de respeito, preguiças, silêncios e amuos, do eu do quero posso e mando!
E quando decidir finalmente deixar o eu do quero, posso e mando, irá sentir que como eu, falhou!
E nada empodera mais um eu do quero, posso e mando, do que sentir que deu cabo de mais um eu!
O eu do quero, posso e mando, torna-se novamente encantador de outros eus!
E o eu, passa a viver com a culpa de não conseguir, aguentar-se num nós!